Federação Nacional dos Trabalhadores em Tecnologia da Informação

A inteligência artificial está ameaçando democracias pelo mundo?

A inteligência artificial está ameaçando democracias pelo mundo?

De montagens a estratégias articuladas, IA já foi utilizada para afetar processos eleitorais em ao menos 50 países, aponta o The New York Times

Inteligência artificial – Desde sua popularização, a inteligência artificial vem gerando alertas sobre seus efeitos em processos eleitorais em todo o mundo. Hoje, há indícios concretos de que ela já impactou eleições em ao menos 50 países, conforme apurou o jornal The New York Times.

LEIA: Ciberataque afeta distribuição de alimentos nos EUA e deixa mercados vazios

Ferramentas baseadas em IA produzem imagens altamente convincentes e são utilizadas para criar conteúdos falsos — como fotos e vídeos de políticos ou seus aliados — que os retratam dizendo ou fazendo algo que nunca ocorreu. Alguns episódios ilustram esse fenômeno:

• No Canadá, uma imagem gerada por IA mostrou Mark Carney, candidato ao cargo de primeiro-ministro, posando com Jeffrey Epstein, o empresário norte-americano acusado de explorar sexualmente mais de 250 menores. A foto foi divulgada na plataforma X antes das eleições de abril.
• Na Polônia, circularam nas redes sociais alertas falsos sobre um possível atentado terrorista, o que poderia levar ao adiamento da votação realizada no mês passado.
• Também na Polônia, um vídeo falso compartilhado no TikTok dava a entender que o ex-presidente Donald Trump havia declarado apoio a Slawomir Mentzen, representante da extrema-direita, o que não aconteceu.
• Na Romênia, a IA influenciou diretamente a primeira fase da eleição presidencial em 2023, gerando a necessidade de um novo pleito. Um áudio criado com clonagem de voz simulava Trump afirmando que o governo romeno estava “destruindo a democracia”.
• Na Argentina, algoritmos alteraram a voz e os movimentos dos lábios do ex-presidente Mauricio Macri.
• Na Coreia do Sul, um vídeo manipulado mostrava o então presidenciável Lee Jae-myung simulando estar em greve de fome.
• Já nos EUA, um conteúdo adulterado digitalmente exibia Kamala Harris dizendo que Donald Trump “se recusava a morrer com dignidade”.

Enquanto a disseminação de conteúdo falso é facilitada por essa tecnologia, rastrear sua origem continua sendo um desafio. Essas ferramentas são usadas intencionalmente para manipular a opinião pública e distorcer resultados eleitorais. Além disso, muitas vezes, os sistemas atuam de forma “invisível”, sem produzir conteúdo explícito.

A propagação de mensagens enganosas por meio de IA também tem acentuado polarizações políticas e alimentado o sentimento de desconfiança nas instituições, particularmente entre eleitores de extrema-direita, com reflexos em disputas na Alemanha, Polônia e Portugal, segundo o New York Times.

A IA em eleições de 2024

Segundo o Painel Internacional sobre o Ambiente da Informação — um grupo independente de especialistas com sede na Suíça —, a IA foi usada em 215 casos relacionados a eleições em 2024. As informações vieram de documentos oficiais, estudos e reportagens.

A análise indica que em 69% dos episódios o uso da IA teve efeitos prejudiciais. Deepfakes — vídeos ou imagens manipulados para imitar pessoas reais — foram empregados para simular vozes de políticos ou para imitar emissoras jornalísticas.

Em contraste, apenas 25% dos casos apresentaram aplicações positivas, como a utilização da tecnologia para traduzir discursos e localizar eleitores em áreas específicas.

Interferência externa: IA a serviço da manipulação internacional

Com a ajuda da inteligência artificial, a criação de contas falsas e a produção de desinformação se tornaram mais rápidas e automatizadas. Países como Rússia, China e Irã estariam por trás das ações mais sofisticadas de interferência eleitoral em outras nações, conforme o NYT.

A pesquisadora Deyse Cioccari, diretora do Instituto Tria, avalia que é necessário desenvolver mecanismos para proteger a soberania eleitoral frente a essas ameaças.

Na Polônia, por exemplo, uma operação russa divulgou vídeos forjados que sugeriam ataques planejados por ucranianos com o objetivo de sabotar a eleição presidencial. Isso ocorreu em um momento em que o país acolhia grande número de refugiados da Ucrânia.

O episódio mais alarmante foi registrado na Romênia, durante o pleito presidencial de 2023. No primeiro turno, Calin Georgescu, candidato da extrema-direita até então pouco conhecido, liderou a votação após uma ação clandestina russa no TikTok. Diante da gravidade do caso, a Justiça determinou a realização de uma nova eleição. Georgescu passou a ser investigado criminalmente e teve sua candidatura anulada.

O episódio foi criticado por figuras como o vice-presidente dos EUA, JD Vance, e por Elon Musk. “Se sua democracia pode ser destruída com algumas centenas de milhares de dólares em publicidade digital de um país estrangeiro, então ela nunca foi muito forte para começar”, declarou Vance em fevereiro.

Durante as eleições presidenciais americanas do ano passado, o uso de IA de forma maliciosa levou órgãos como a CISA, o FBI e o Escritório do Diretor de Inteligência Nacional a emitir alertas públicos. Ainda sob a gestão Trump, as equipes responsáveis por monitorar essas ameaças haviam sido dissolvidas.

Governos e big techs sob pressão

Embora plataformas como Facebook, X, YouTube e TikTok já tenham diretrizes para coibir o mau uso da IA, elas enfrentam dificuldade crescente para detectar e conter conteúdos forjados, sobretudo diante do avanço das tecnologias generativas.

Estudos apontam que perfis automatizados com IA conseguem escapar dos sistemas de moderação em redes como LinkedIn, Reddit, TikTok e nas plataformas da Meta (Facebook, Instagram e WhatsApp).

Em 2024, a OpenAI relatou a interrupção de cinco campanhas de influência em diferentes países — incluindo Estados Unidos, Índia e membros da União Europeia. A empresa também identificou uma ação russa que utilizou o ChatGPT para promover um partido de extrema-direita na Alemanha.

A União Europeia, por sua vez, abriu uma investigação para apurar se o TikTok tomou as medidas necessárias para conter a desinformação nas eleições da Romênia, Irlanda e Croácia. A plataforma alegou ter removido mais de 7.300 publicações em duas semanas, mas preferiu não se manifestar sobre o andamento das investigações.

(Com informações de Olhar Digital)
(Fonte: Reprodução/Freepik/DC Studio)

Compartilhe:

Outras publicações