Arroba – Em português, chamamos de “arroba”. Em outros idiomas, ele pode ser o “cachorrinho”, o “caracol” ou o “rabo de macaco”. Mas o sinal @ surgiu muito antes da internet ou dos endereços de e-mail se tornarem parte da rotina.
Em 2010, a curadora de arquitetura e design Paola Antonelli, do Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), tomou uma decisão ousada: incluir o símbolo @ na coleção permanente do museu.
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“Eu queria uma exposição de objetos que demonstrasse que todos podem ter uma exposição com qualidade de museu dentro da sua gaveta. Isso inclui o bloco de Post-it, M&Ms, o clipe de papel, OXO Good Grips [um conjunto popular de utensílios de cozinha], objetos que são tão incorporados às nossas vidas e funcionam tão bem que nem prestamos mais atenção neles”, explicou.
Sinal onipresente
Basta olhar para o teclado: tirando os símbolos monetários, talvez nenhum outro caractere carregue tanto peso cultural quanto o @. A arroba é uma peça essencial da internet, conectando endereços de e-mail e destacando nomes de usuário em plataformas digitais.
Sinais como &, #, % e * também são amplamente usados, mas poucos alcançaram o status quase mítico do @. Apesar de parecer um símbolo da era digital, sua história é muito mais antiga. Entre suas curvas esconde-se uma trajetória que atravessa línguas, fronteiras e milênios.
“Trata-se de uma abreviação”, explica Keith Houston, autor do livro Shady Characters: The Secret History of Punctuation (“Caracteres obscuros: a história secreta da pontuação”, em tradução livre). A dúvida é: qual o seu significado original? Uma pista leva à cerâmica.
O nascimento da arroba
Os antigos gregos produziam vasos de argila conhecidos como ânforas – altos, com alças laterais e gargalo estreito – usados para armazenar vinho, azeite, cereais e outros produtos. Com o tempo, se tornou também uma unidade de medida.
“Os comerciantes precisavam comunicar frequentemente a ideia de que ‘vou vender a você uma certa quantidade de ânforas de alguma coisa a um preço específico'”, conta Houston.
Para facilitar, começaram a abreviar a palavra desenhando a letra “a” com uma cauda longa, que se enrolava em torno dela – o embrião do símbolo @.
O primeiro registro conhecido do uso moderno do sinal é de 4 de maio de 1536. Nesse dia, o comerciante Francesco Lapi escreveu de Sevilha, na Espanha, para Roma, informando que uma ânfora de vinho custava cerca de 70 ou 80 ducados. Ele usou @ para representar “ânfora”.
Outros exemplos mais antigos existem – como um manuscrito búlgaro de 1375, em que o símbolo aparece apenas como enfeite da palavra “amém” –, mas sem função prática.
Jornada até a datilografia
Mesmo depois de as ânforas caírem em desuso, o sinal @ permaneceu nas anotações de contadores e comerciantes, indicando preços e quantidades.
“Isso ocorreu graças às máquinas de escrever, que se difundiram primeiramente nos Estados Unidos, no século 19”, explica o professor de tipografia Gerry Leonidas, da Universidade de Reading, no Reino Unido.
O crescimento dos catálogos de compras por correspondência gerou uma imensa necessidade de organização administrativa – e de datilógrafos profissionais.
“A máquina de escrever é essencialmente uma forma de minimizar os riscos ocasionados pela má caligrafia das pessoas, aumentando a eficiência e a previsibilidade da administração dos escritórios”, diz Leonidas.
Embora caras e limitadas (algumas nem incluíam os números “1” e “0”), as máquinas já traziam o símbolo @ no final do século 19, um vestígio de seu uso contábil.
“Como as máquinas de escrever estão relacionadas aos processos comerciais e contábeis, @ sobreviveu ao longo de diferentes gerações de máquinas de escrever, exatamente porque desempenha esse papel fundamental”, explica o professor.
Reinvenção digital
Com a chegada dos computadores, o símbolo foi mantido nos teclados, mas pouco utilizado, até que o engenheiro Ray Tomlinson (1941–2016) mudou tudo. Trabalhando na Arpanet, projeto precursor da internet, Tomlinson buscava uma maneira de permitir a troca de mensagens entre usuários.
Ao escrever o código, percebeu que precisava de um marcador para indicar o local de cada pessoa dentro da rede. E lá estava o @, pronto para cumprir o papel. Assim, em 1971, ele enviou o primeiro e-mail da história — e o símbolo passou a representar a própria comunicação digital.
Com a expansão da internet, o @ ganhou o mundo — e novos apelidos. Na Itália, é chiocciola (“caracol”); em hebraico, strudel; no tcheco, zavináč, um tipo de arenque enrolado; na Rússia, sobaka, “cachorro”. Em holandês, é apenstaartje, “rabo de macaco”.
O belga Nick Fransen, consultor de gestão, lembra que ainda usa o nome tradicional. “Mas, alguns dias atrás, eu conversava com uma pessoa idosa que não falava muitos termos em inglês e voltei a chamar @ de apenstaartje, sem nem mesmo pensar a respeito”, conta.
Em inglês, o símbolo é chamado simplesmente at (“em”), embora às vezes seja referido como “em comercial”. Em português e espanhol, “arroba” designava originalmente uma unidade de medida — e no Brasil equivale a 15 kg.
Hoje, porém, o sinal é também usado para expressar gênero neutro em palavras como amig@s, tornando-se símbolo de inclusão.
“O motivo de @ não ter um nome especial em inglês é porque a sua definição inicial é muito clara e facilmente transmitida”, explica Leonidas. “Mas, à medida que as pessoas começam a adaptar esses símbolos para seus idiomas locais, eles precisam de uma forma de se lembrar dele.”
Segundo o professor, a forma do símbolo, e o modo como ele obriga o uso de letras minúsculas e sem espaços, influencia até nossa identidade online.
“Precisamos inventar uma única palavra exclusiva para nós mesmos. Isso nos força a pensar como devemos apresentar nossa identidade”, afirma.
Pesquisas mostram que escolher um nome de usuário pode ser uma experiência emocional: não basta ser único, ele precisa “soar certo” e representar quem somos. Assim, @ tornou-se inseparável da nossa identidade digital – um pequeno elo entre o real e o virtual.
(Com informações de g1)
(Foto: Reprodução/Freepik/EyeEm)