BRICS – Em um contundente posicionamento pela autoafirmação da maioria global, o bloco BRICS defendeu, durante sua cúpula, o direito inalienável dos países de regulamentar o mercado de inteligência artificial e estabelecer seus próprios marcos legais. A declaração específica sobre IA, divulgada neste domingo (6), surge como um claro contraponto à concentração monopólica das gigantes tecnológicas estadunidenses e às crescentes ameaças de retaliação do governo Trump contra nações que ousam impor regulações ou taxações ao setor.
O comunicado do grupo, que representa uma significativa parcela da economia e população mundial, afirma com firmeza: “Apoiamos resolutamente o direito de todos os países de aproveitar os benefícios da economia digital e das tecnologias emergentes, particularmente da inteligência artificial, enquanto defendem direitos fundamentais, estabelecendo seus próprios marcos regulatórios dentro de suas jurisdições”. Esta reivindicação de soberania digital é um pilar central do texto.
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Além da defesa da capacidade regulatória nacional, o BRICS reforçou com ênfase a necessidade de remuneração justa por direitos autorais quando conteúdo protegido é utilizado para treinar modelos de IA. O bloco argumenta que “proteção adequada dos direitos de propriedade intelectual e, em particular, dos direitos autorais contra o uso não autorizado pela IA deve estar em vigor para prevenir a extração exploratória de dados e violação de privacidade, permitindo mecanismos de remuneração justa”.
Esta posição coloca o BRICS em rota de colisão direta com o establishment tecnológico estadunidense. Empresas como Google e OpenAI opõem-se ferozmente a pagar por direitos autorais, utilizando a alegação do “fair use” (uso justo) – um conceito legal americano – e argumentando que tal pagamento “sufocaria a inovação”.
O governo brasileiro, integrante do bloco, aponta uma notável inversão de retórica: a mesma argumentação usada décadas atrás por nações ricas para proteger patentes farmacêuticas e impedir sua quebra por países emergentes é agora empregada pelas big techs para evitar remunerar criadores.
O cerco monopolista e as ameaças de retaliação
A declaração do BRICS destaca que a competição justa e a regulação de mercado “estão no coração de um futuro equitativo” para a IA, um princípio já adotado em ações como a Lei dos Mercados Digitais da União Europeia, que multou plataformas por práticas monopolistas.
No entanto, esta busca por regulação equitativa tem sido alvo de ataques frontais do governo Trump, que atua em sintonia com os interesses das big techs. O governo estadunidense tem ameaçado – e de fato implementado – retaliações contra países que avançam com regulações. Recentemente, pressionou com sucesso o Canadá a recuar da cobrança de uma tarifa sobre o setor tecnológico, após Trump ameaçar encerrar negociações comerciais e classificar a medida como um “ataque flagrante”.
A postura agressiva foi reafirmada publicamente pelo vice-presidente americano, JD Vance, em Paris: “O governo Trump está preocupado… Os Estados Unidos não podem e não vão aceitar” regulamentações estrangeiras sobre empresas de tecnologia dos EUA, referindo-se especificamente à legislação europeia.
A declaração conjunta do BRICS, portanto, transcende o tema específico da IA. Ela representa um forte apelo por um reequilíbrio do poder digital global, rejeitando a imposição unilateral de regras que beneficiam um punhado de corporações e um único governo.
É uma afirmação clara de que a “maioria global” exige e exercerá seu direito de moldar o futuro tecnológico, enfrentando a concentração monopólica e as pressões políticas que buscam perpetuá-la. A batalha pela governança da IA tornou-se um palco crucial para esta luta mais ampla por equidade e soberania no cenário internacional.
(Com informações de Folha de S. Paulo)
(Foto: Reprodução/Freepik/bonekot)