Ao fim da quarentena, profissionais devem encontrar ambientes de trabalho com menos gente, sem mesas definidas para cada funcionário e com mais áreas de reunião —isso se o escritório ainda continuar lá.
Após meses de home office forçado, 73,8% das empresas pretendem implementar a prática de forma permanente no Brasil, segundo estudo da consultoria Cushman & Wakefield, que ouviu 122 executivos de multinacionais em abril.
“Quanto mais a quarentena durar, mais companhias devem aderir ao modelo. As pessoas vão ficar habituadas, e o diferente será voltar ao escritório”, diz André Miceli, coordenador do MBA de marketing e negócios digitais da FGV (Fundação Getulio Vargas).
“A pandemia não criou tendências. A do home office estava em curso, mas sofreu uma intensa aceleração”, diz.
No início do ano, a fabricante de cimento franco-suíça LafargeHolcim já havia estimulado que seus empregados administrativos no Rio de Janeiro trabalhassem ao menos um dia de casa. A ideia era reduzir aos poucos a resistência dos gestores ao sistema remoto.
Com a implantação do modelo nos últimos três meses, a companhia sentiu um aumento da produtividade. Decidiu, então, fechar o escritório na capital fluminense e manter os 150 funcionários em teletrabalho de modo permanente.
“É uma oportunidade boa para o empregado, que poderá ter um maior equilíbrio entre vida pessoal e profissional, e para a empresa, em termos de custo”, diz a diretora de recursos humanos e comunicação, Juliana Andrigueto.
A estimativa da fabricante é que a medida gere uma economia de R$ 2 milhões por ano.
A companhia planeja ainda adotar de três a quatro dias de home office nos outros escritórios, em São Paulo e Pedro Leopoldo (MG). Com isso, os espaços deverão ser reduzidos e ganhar salas de reunião.
Já a empresa de tecnologia Aktie Now decidiu manter os postos de trabalho dentro de sua sede, em São Caetano do Sul (SP), após uma pesquisa mostrar que quase 60% dos 34 funcionários querem continuar indo ao escritório pelo menos três vezes por semana, quando for seguro voltar.
Mas não haverá mais uma mesa exclusiva para cada empregado. Os lugares agora serão compartilhados, diz o diretor-executivo, Bruno Stuchi. Uma reforma, já prevista antes da pandemia, vai ampliar as áreas de convivência.
Há três anos na Aktie Now, Bruno Lopes, 23, formado em sistemas de informação, é um dos que desejam voltar a trabalhar no escritório.
Durante esta quarentena, ele sofreu com interrupções da mãe no meio de videoconferências e teve dificuldades para executar tarefas que exigiam interação com a equipe.
“Antes, eu achava que o home office seria o mundo perfeito. Agora que vivi essa experiência, tive a percepção de que ele é muito bom em alguns aspectos, mas em outros é preciso estar no escritório.”
Apesar da familiaridade que têm com a internet, os jovens são os que mais se desiludiram com o trabalho remoto, segundo um estudo da consultoria Consumoteca, que ouviu 2.000 brasileiros de diferentes gerações.
Sete em cada dez profissionais com idades entre 18 e 25 anos disseram que preferem não trabalhar de casa em tempo integral após a Covid-19.
Um dos principais motivos é que, justamente no momento de entrada na vida adulta, esses jovens ficaram sob vigilância total dos pais, afirma o antropólogo Michel Alcoforado, sócio da Consumoteca.
“A maioria das pessoas não quer voltar a ir todo dia para a firma, mas também não quer ficar presa dentro de casa”, diz.
Segundo o antropólogo, é importante que os departamentos de RH estejam atentos para evitar que a intensificação do home office acentue ainda mais as desigualdades nas corporações —por exemplo, em relação a empregados que moram em espaços pequenos ou às mulheres, em geral mais sobrecarregadas com as tarefas domésticas.
Para as empresas que adotarem de vez o teletrabalho, também não será fácil manter o mesmo nível de produtividade que têm agora.
“Os profissionais que estão em home office hoje já se conhecem. É difícil gerar confiança e senso de pertencimento em equipes montadas virtualmente”, diz Miceli, da FGV.
Na opinião do professor, deve ganhar força o modelo híbrido, cujo equilíbrio entre casa e escritório será ajustado na prática pelas companhias.
Isso passa por pensar em rodízios entre as equipes, evitando que a empresa fique cheia num dia e vazia em outro.
Se os funcionários não serão mais obrigados a comparecer ao trabalho, o ambiente corporativo terá que ficar mais atraente, diz Ivo Wonhrath, sócio do escritório de arquitetura Athié Wohnrath.
Cresce, assim, a necessidade de haver mais áreas para confraternização. E a estética desses espaços deverá ficar mais parecida com a das casas. “A parte boa do home office é estar em um ambiente mais acolhedor, e o escritório deve ir migrando para isso.”
Via: Folha de S.Paulo
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