Data centers – Os primeiros data centers projetados para inteligência artificial estão em fase de implantação no Sul do país, gerando uma disputa por infraestrutura energética e soluções avançadas de resfriamento a água.
A empresa americana RT One revelou planos de erguer um data center em Maringá (PR), com capacidade máxima de 400 MW e previsão de operação em um ano e meio. O consumo energético do complexo equivale ao de uma cidade brasileira com 640 mil moradores.
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Já a Scala Data Center anunciou no final de 2023 a construção de um campus especializado em IA em Eldorado do Sul (RS), a 17 km de Porto Alegre. A unidade terá inicialmente 60 MW, mas poderá chegar a 4.750 MW, dependendo da procura.
Diferente dos data centers convencionais, essas estruturas utilizam placas gráficas (GPUs) da Nvidia e uma arquitetura otimizada para alto desempenho.
Essa modernização eleva em 11 vezes o gasto de energia e a geração de calor por rack — conjunto de servidores interligados. Enquanto um equipamento tradicional consome 12 KW, o modelo da Nvidia demanda 132 KW, similar ao consumo médio de 500 residências no Brasil.
A fabricante de chips defende que o ganho em eficiência compensa o aumento no uso de eletricidade.

Por isso, as empresas estão se instalando no Sul, onde há maior disponibilidade de energia — graças à proximidade com Itaipu —, infraestrutura de cabos submarinos para conexão internacional e clima mais ameno em certos períodos.
Essa tendência contraria a estratégia governamental de atrair investimentos para o Nordeste, que possui parques eólicos e solares. A instabilidade dessas fontes e deficiências na rede de distribuição, no entanto, são obstáculos para o setor.
Além de atender à América Latina, o objetivo desses mega data centers é exportar serviços de processamento para empresas dos EUA.
“É uma maneira inteligente de exportar energia com alto valor agregado. Seria como vender cápsulas de café em vez de grãos in natura”, compara Cleber Braz, diretor de operações da Scala.
Como o treinamento de sistemas de IA, como ChatGPT ou Deepseek, pode levar meses, a localização do data center não é um problema. Atualmente, a maioria dessas operações ocorre nos EUA, onde a matriz energética é 75% poluente, indo contra as metas de sustentabilidade das gigantes de tecnologia.
Segundo especialistas, o Brasil pode se destacar no mercado por oferecer energia limpa a custos competitivos.
“Queremos seguir as normas emergentes de sustentabilidade e energia verde para atender toda a região das Américas”, diz Fernando Palamone, sócio da RT One.
No entanto, esses data centers trazem impactos ambientais. Os modelos dedicados à IA exigem refrigeração líquida — geralmente uma mistura de água e álcool —, enquanto os convencionais usam apenas ar-condicionado, reduzindo o consumo hídrico.
“Brincamos que as máquinas de IA precisam estar ‘fritando’, operando no limite térmico”, afirma Márcio Aguiar, diretor da Nvidia para data centers na América Latina.
A Nvidia auxilia empresas no desenvolvimento de sistemas de resfriamento líquido, que funcionam como serpentinas: um fluido gelado circula por tubos próximos ao hardware. Até as placas são envoltas por microtubos.
Segundo Agostinho Vilela, diretor de tecnologia da Scala, o resfriamento a ar se torna inviável acima de 50 KW. Como a água é 3.000 vezes mais eficiente, o volume necessário é menor.
“Um fluxo de ar muito intenso derrubaria os servidores. Estudamos há mais de um ano a refrigeração líquida, essencial para racks de IA”, explica.
Há dois métodos de resfriamento: um sistema fechado (que quase não consome água) e outro aberto (onde a água evapora, resfriando as máquinas). A Scala e a RT One optarão pelo primeiro, enquanto Google e Amazon usam o segundo. A Microsoft anunciou que abandonou a evaporação em novembro de 2023.
Relatórios de sustentabilidade mostram que o Google consumiu 23,1 bilhões de litros de água em 2023 (+17% ante 2022), e a Microsoft, 22% a mais no mesmo período. Ambas afirmam usar água de reuso e pluvial para preservar fontes limpas.
Apesar da energia limpa e água barata, empresas temem entraves jurídicos no Brasil. Um marco regulatório rígido sobre direitos autorais poderia afastar clientes estrangeiros. Setores culturais e midiáticos pressionam por remuneração pelo uso de obras na internet sem autorização, assim como já ocorre em outros países.
Além disso, as empresas buscam incentivos fiscais com o Ministério do Desenvolvimento para reduzir custos e tornar o serviço mais atrativo a multinacionais.
(Com informações de Folha de S.Paulo)
(Foto: Reprodução/Freepik/salmansaheem)